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Por adyashanti, DESPERTANDO NO NÍVEL DAS ENTRANHAS (parte 3) (fluxo entrega)

DESPERTANDO NO NÍVEL DAS ENTRANHAS


O terceiro tipo de despertar é o despertar no nível das entranhas, que é nosso senso de self mais existencial. É aquela parte de nós em que existe um tipo básico de posse - uma posse de nossas raízes. É como ter um punho cerrado no meio das entranhas; é nosso senso de self mais rudimentar. É aquilo que aperta e contrai. É aquele apertar e contrair em torno do qual todos os outros sensos de self são construídos.

Quando o Espírito ou consciência entra na forma, na mani-festação, inicialmente isso é vivenciado como um choque. Esse movimento súbito vindo de um potencial ilimitado para a experiência limitada da forma é chocante para a própria consciência.

Esse aperto nas entranhas é aquela contração, aquele choque experimentado no nível físico.

Para se ter noção do que estou descrevendo, imagine que você está nascendo. Está saindo de um ambiente totalmente pro-tegido, aquecido e nutridor e, subitamente, chega a uma sala. O lugar é muito mais frio do que aquele de onde você veio; existem luzes ofuscantes e vozes altas. Alguém o segura à força, puxando-O.

Essa é sua apresentação à vida, à vida fora do útero. Se puder imaginar isso, fica fácil entender como esse bebezinho poderia sentir um nó nas entranhas. O nascimento é tão violento, tão súbito e tão inesperado que pode criar esse tipo de aperto.

Além desse choque inicial de chegar à forma, temos várias experiências que reforçam um aperto nas entranhas ao longo de nossa vida. Seja na infância, seja no processo de crescimento, de empos em tempos a maioria de nós tem experiências que nos fazem contrair em medo e choque. Essas experiências exacerbam aquele aperto no nível das entranhas.

Como encontramos esse aperto? Como lidamos com ele?

No final das contas, remos de encontrar o medo daquele aperto , porque o aperto é isto somente uma resposta ao medo. É como se você tivesse um punho cerrado agarrado a sua entranha, c do está gritando: "Não, não, não, não, não! Não a vida, não a morte

não ao ser, não ao não serl Não, não, naol Vou agarrar! Vou segurar! Não vou abrir mão!".

Mesmo o movimento rumo ao despertar pode, às vezes, ge rar medo. A medida que as pessoas se aproximam do despertas, e normal elas experienciarem o medo - porque o despertar é uma liberação repentina desse aperto nas entranhas. Não existem garantias de que esse aperto não retornará; ele pode segurar e apertar novamente. Mas, a princípio, o despertar é uma liberação dessa retenção. Conforme as pessoas se aproximam do despertar, elas geralmente experimentam uma sensação intuitiva de agarrar e segurar ainda mais firme, como se fossem ser destruídas ou mortas. É um medo irracional que emerge pelo sistema.

Quando as pessoas me contam que estão tendo esse tipo de experiência, a primeira coisa que lhes digo é que isso é comum, que quase todos passam por essa experiência em algum momen-to. "Não é um problema", afirmo. "Você está apenas se tornando consciente de um aperto do qual, talvez, não tivesse consciência anteriormente."

A essa altura, uma pergunta comum é: "Como me livro disso?. Essa pergunta surge da perspectiva da consciência egoica. A consciência egoica sempre quer se livrar do que não é confortável.

Mas, é claro, seja o que for de que tente se livrar, você tende a sustentar. O próprio ato de tentar se livrar de alguma coisa sustenta. Ao tentar se livrar de algo, inconscientemente você sid concedendo-lhe realidade. Se estiver tentando livrar se de algo. precisa perceber isso como real, pois essa concessão inconsciente de realidade adiciona energia a coisa da qual você está renando se livrar. Esse tipo de agarramento não pode ser resolvido por meio de uma técnica. De certa forma, a consciência de que não Inimada que se posa fazer é a comprensão mais importante que você pode ter.

Perguntar "O que devo fazer?" é uma forma velada de dizer

"Como controlo esta situação?". O único antidoto para esse tipo de intenção obstinada é soltá-la. Como alguém se livra da intenção obstinada? Bem, isso é bem ardiloso, porque até o esforço para abrir mão da intencionalidade é, em si, um ato intencional.

Provavelmente, todo mundo já teve uma experiência de tentar soltar ou entregar, mas tentar e entregar são conceitos mutuamente excludentes. Enquanto estivermos tentando, não haverá entrega.

Assim, chega o momento em que toda técnica desaparece, em que nos faltará tudo que já aprendemos sobre como reajustar a consciência para um estado mais claro. Nossas técnicas não terão utilidade. Haverá um momento em que teremos de compreender que não há nada que "eu" possa fazer para soltar o nível existencial; não há nada que "eu" possa fazer para me entregar.

No entanto, entregar e soltar é o que é pedido.

Nesse ponto, a coisa mais importante é admitir este fato: não há nada que o "eu possa fazer. Admiti-lo plenamente, ser totalmente penetrado por essa consciência, é em si a entrega fi-nal; é em si a abertura do punho cerrado, a abertura do senso de

sef mais existencial, mais rudimentar.

Para que isso aconteça, é preciso ver que não há nenhuma maneira de fazê-lo. É preciso chegar ao fim da linha; você precis chegar ao fim de sua corda. Só então a entrega espontânea pode acontecer. A única coisa que podemos fazer como seres humanos é entender que todo segurar é futill, todo segurar é uma forma velada de rejeitar quem e o que realmente somos.

Ao soltar o segurar no nível das entranhas, pode parecer que você irá morrer. Mas você não morre, a ilusão de um self separado morre. Ainda assim, pode parecer que você vai morrer. Somente quando estiver disposto a morrer em nome da verdade é que es aperto pode, real e autenticamente, se soltar.

Antes de prosseguir, quero acrescentar algo que possa se aplicar a algumas pessoas. Alguns indivíduos tiveram períodos extraordinariamente difíceis na vida - passaram por eventos traumáticos que podem ter causado um aperto ainda mais profundo nesse nível básico do ser. Para tais indivíduos, o aperto no nível das entranhas pode ser reforçado à medida que se aproximam de um estágio mais profundo de consciência. Se for esse o seu caso, é importante não forçar nada. Você pode precisar de ajuda especializada para lidar com esse aspecto do despertar; pode ser necessário encontrar algum meio para abordar a sensação mais profunda de trauma que estiver vivenciando antes de ser capaz de soltá-la. Se for esse o caso, recomendo que encontre alguém que verdadeiramente saiba como lidar com tais experiências, como encontrá-las de uma forma proveitosa. Você saberá que a abordagem que essa pessoa está oferecendo é valiosa porque ela vai começar a funcionar. Esse nível básico de apego vai começar a se soltar.

Obviamente, crescer é traumático para todos nós em algum nível. Mesmo que você tenha tido uma criação maravilhosa, os pais mais amorosos e o ambiente mais estimulante do mundo, não há crescimento sem que se experimente algum nível de trauma. A vida em si é traumática, em certo sentido; é traumática Para um senso de self separado. A vida em si é uma ameaça para o senso de um self separado. Não há como escapar disso.

Despertar no nível das entranhas exige encarar e liberar nosso mais profundo medo existencial. Também exige encarar e liberar que chamo de vontade pessoal, ou a parte de nós que diz:

"Isto é o que quero e do jeito que quero que seja".

No final a vontade pessoal é uma ilusão , por isso é tão frustrante quando tentamos usá-la para controlar e determinar os acontecimentos.

Mas, ilusão ou não, isso precisa ser encarado e trabalhado. Essa tarefa pede a entrega mais profunda, a devoção mais profunda e sinceridade para com a verdade em si.

A verdadeira percepção, a iluminação verdadeira, surge de uma completa abdicação da vontade pessoal - um soltar total. É claro, com frequência isso gera medo em nosso senso de self ilusório, que só pode interpretar o abrir mão da vontade pessoal como traumático.

Tememos que o soltar vá nos expor ao perigo. Achamos que se soltarmos nossa vontade pessoal, jamais obteremos o que queremos, o mundo jamais será do jeito que queremos que seja, e nada jamais irá acontecer do jeito que queremos que aconteça.

O que finalmente vemos é que essas conclusões são em si apenas pensamentos. Na verdade, não existe algo como uma vontade pessoal, mas até enxergarmos isso, a experiência da obstinação é algo em que devemos nos engajar.

É onde começamos a encontrar a sabedoria de estar desiludido. Quando nos sentimos desiludidos com algo, isso significa que estamos chegando ao fim de nossa obstinação. A transformação acontece somente quando chegamos ao fim de nossa obstinação.

Quem foi viciado em drogas ou álcool e se recuperou sabe que um componente muito importante na recuperação é chegar ao fim de sua vontade pessoal. Você compreende que não pode mudar seu vício por meio da obstinação; sua vontade não é assim tão forte, e você não pode fazer isso sozinho. Quando um Viciado "sai do fundo do poço", o que isso realmente significa é que sua vontade pessoal foi esgotada. E quando nossa vontade pessoal é esgotada, toda uma nova força passa a percorrer nosso sistema. E a força do Espírito, e ela pode agora tornar se operacional, porque não a estamos mais evitando ao nos agarrar à nossa vontade pessoal.

Todos nós, em nosso próprio processo de despertar, iremos visitar a limitação de nossa vontade pessoal. A maioria de nós irá visitá-la em vários momentos, em níveis mais e mais profundos até que ela seja totalmente extinta.

A perda da vontade pessoal não é uma perda, em absoluto.

Não é como se nos tornássemos o capacho da humanidade, sem saber o que fazer ou como fazê-lo. Ao contrário. Ao abrir mão da ilusão da vontade pessoal, um estado de consciência totalmente diferente nasce em nós; acontece um renascimento. É quase como se uma ressurreição acontecesse vinda das profundezas de nós. É muito difícil explicar essa ressurreição, como tantas coisas na espiritualidade, mas em essência começamos a ser movidos pela completude e totalidade da própria vida.

A representação desse tipo de movimento é muito vívida na tradição taoista, que foca a expressão do Tao, ou da verdade, por meio de nós. Ao ler o Tao Ie Ching ou olhar para alguns dos ensinamentos taoistas, você começa a sentir como a obstinação é substituída por um senso de fluxo.

Quando você deixa o banco do motorista, vê que a vida pode dirigir a si mesma, que de fato a vida sempre dirige a si mes-ma. Quando você deixa o banco do motorista, a vida pode dirigir a si mesma bem mais facilmente - pode fluir de formas que você jamais imaginou. A vida torna-se quase mágica. A ilusão do "ou não está mais no caminho. A vida começa a fluir, e você nunca sabe para onde ela vai levá-lo.

Quando seu senso de vontade pessoal diminui, as pessoas frequentemente me dizem: "Não sei mais como tomar uma decisão

. Isso porque elas estão operando cada vez menos a partir de um ponto de vista pessoal. Existe um novo modo de operar, e realmente não tem a ver com tomar esta ou aquela decisão, com a decisão certa ou errada. É mais como navegar por uma correnteza.

Você sente para onde os acontecimentos estão se movendo, e sente qual a coisa certa a fazer. E como um rio que sabe como contornar uma rocha - à esquerda ou à direita. É uma sensação de saber intuitiva e inata.

Esse tipo de fluxo está sempre disponível para nós, mas a maioria de nós está muito perdida nas complexidades de nosso pensar para sentir que existe um fluxo natural e simples na vida.

Mas sob a confusão do pensamento e da emoção, e sob a pressão da vontade pessoal, há realmente um fluxo. Existe um movimento simples da vida.

Uma das minhas definições favoritas de iluminação é a de um padre jesuíta chamado Anthony de Mello, que faleceu há alguns anos. Alguém pediu a ele para definir sua experiência de iluminação. Ele disse: "Iluminação é a cooperação absoluta com o inevitável". Eu adoro isso, porque define a iluminação não só como uma percepção, mas como uma atividade. Iluminação é quando tudo dentro de nós está em cooperação com o fluxo da própria vida, com o inevitável.

Quando não estamos tão ambivalentes e divididos internamente, temos um feeling para o inevitável - para onde a vida está se movendo, em que direção ela está seguindo. Não nos perguntamos mais "Este é o caminho certo? Como sei se este é o caminho certo ou o errado?". Esse tipo de pergunta, na verdade, distorce a nossa percepção. Tem algo muito mais sutil acontecendo: é o fluxo da própria vida.

A medida que soltamos nossa obstinação - à medida que enfentamos o medo nas entranhas e descobrimos a disposição smncera para dizer sim ao que for que tenhamos medo -, Tudo de quê falo torna-se disponível para nós. Quando dizemos um sim simples e sincero a vida, um sim a morte, um sim a disolução do Próprio ego, cnão termos mais de lutar . Isso se torna um novo caminho de navegação pela vida. O fluxo é o que nos faz navegar pela vida - não conceitos e ideias, não o que deveríamos ou não fazer, não o que é certo ou errado. Com o tempo, o que passamos a ver é que o fluxo é sempre maravilhoso. É a expressão da unidade, direciona nossa existência de maneiras que são curadoras e amorosas, e une as coisas de formas tais que não podemos imaginar.

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